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MERCÚRIO AMAZÔNIA EIPI BE

@ Original illustration_Mauricio Negro | Mercúrio Amazônia EIPI BE | Garimpeiro e bateia
No final de setembro de 2022, Daniel Munduruku e eu tomamos um voo de Guarulhos com destino a Santarém, no Pará. Na mochila, pouca roupa, máscaras, material de trabalho e disposição para colaborar com um projeto de pesquisa, financiado pela Fiocruz em parceria com a WWF-Brasil, sobre o impacto do garimpo de ouro na Amazônia, mais especificamente entre os Munduruku, no Médio Tapajós. O convite para nos juntarmos ao grupo de pesquisa sobre os impactos do mercúrio na saúde indígena foi feito pelo médico, pesquisador e doutor em saúde pública Paulo Cesar Basta, coordenador do estudo e pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e pela bióloga e pesquisadora em saúde pública Ana Claudia Santiago de Vasconcellos, coordenadora de projetos de pesquisa na área da saúde indígena da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Como bolsistas, fomos convocados para atuar como condutores de uma oficina de organização do material didático do projeto e do curso na Associação Indígena Pariri
@ foto_Mauricio Negro | partida de Santarém, PA
De Santarém, um dia depois, partimos para Itaituba, também conhecida por "cidade pepita". Em tupi, itá'imtyba significa ajuntamento de pedrinhas. Em vez da lancha, que faria o percurso pelo rio Tapajós em menos tempo, fomos de barco a pedido do Daniel. Só foi preciso comprar redes e cobertores. A sugestão tinha fundamento. Desacelerar aos poucos, aproveitae a viagem para refletir sobre a nossa participação, dormir um pouco, botar a conversa e as leituras em dia. 
@ fotos_Mauricio Negro | ponto de venda de passagens | mapa da região | Fordlândia
Foram dezoito horas de viagem, houve uma série de paradas. Algumas pessoas desembarcaram em Aveiro. Outras, em Fordlândia, Brasília Legal e Barreiro, antes de chegarmos em Itaituba. Eram poucos os passageiros, mas o barco seguiu carregado de mercadorias. O que provavelmente explica a travessia mais longa do que previsto. Após o pernoite em Itaituba, seguimos pela manhã para a sede da Associação Indígena Pariri, cujo objetivo principal é lutar pela sobrevivência física e cultural do povo Munduruku do Médio Tapajós, representando legalmente onze aldeias: Praia do Mangue, Praia do Índio, Sawre Apompu, Sawre Jaybu (T.I. Sawre Bapim); Dace Watpu, Sawre Muybu, Boa Fé, Karo Muybu, Dajekapap, Sawre Aboy, Poxo Muybu, (T.I. Sawre Muybu). 
@ foto_Mauricio Negro | Margens do rio Tapajós
Na Associação Indígena Pariri nos encontramos com a parceira Maria Cristina Cabral Troncarelli, a Bimba, especialista em educação escolar indígena da Cátedra Kaapora (UNIFESP); e com Nuno Godolphim, produtor executivo de Amazônia, a nova Minamata?, dirigido pelo cineasta Jorge Bodanzky. O documentário trata da saga do povo Munduruku para conter o impacto destrutivo do garimpo de ouro em seu território ancestral, enquanto revela como a doença de Minamata, decorrente da contaminação por mercúrio no Japão nos anos 1950, ameaça os habitantes de toda a Amazônia hoje.

Um estudo realizado pela Fiocruz em parceria com o WWF-Brasil indicou que todos os participantes da pesquisa estão afetados pelo metal contaminante. De cada dez participantes, seis apresentaram níveis de mercúrio acima de limites seguros: cerca de 57,9% dos participantes apresentaram níveis de mercúrio acima de 6µg.g-1 – que é o limite máximo de segurança estabelecido por agências de saúde.
O projeto foi motivado por uma carta enviada pela Associação Indígena Pariri, cientes das ações da Fiocruz junto aos Yanomami. Ela dizia que os Munduruku conseguem ouvir a floresta gritar Odaxijom pedindo socorro. As feridas que ficam cada dia maiores e mais profundas são as barragens, as hidrelétricas, o desmatamento, as queimadas e sobretudo a invasão do território por garimpeiros para extração ilegal de ouro. Em 2017, foi firmada uma parceria entre a Associação Indígena Pariri, que representa os indígenas Munduruku que vivem na região do médio rio Tapajós, e a Fundação Oswaldo Cruz, mais conhecida como Fiocruz

O processo incluiu entrevistas, avaliação clínico-laboratorial, coleta de amostras de cabelo e coleta de amostras de peixes para aferição dos níveis de mercúrio entre os Munduruku.

“Os indígenas querem saber o que comer, pois os peixes contaminados estão na nossa mesa e o alimento que temos vem do rio. A presença do garimpo afeta não só a saúde, mas toda a nossa vida social com a chegada das drogas, da violência doméstica e da prostituição. É preocupante, precisamos de uma solução. A gente tem que criminalizar e punir as pessoas que contaminam o rio."

Alessandra Korap Munduruku, liderança 
A análise revelou que os peixes, principal fonte de proteína das comunidades, também estão contaminados. Dados obtidos a partir das entrevistas indicaram que 96% dos participantes ingerem peixes regularmente. Foram capturados 88 exemplares de peixes, pertencentes a 18 espécies distintas: todos estavam contaminados. A partir daí, o estudo descobriu que as doses de ingestão diária de mercúrio estimadas para os participantes, de acordo com cinco espécies de peixes piscívoros amostrados, foram 4 a 18 vezes superiores aos limites seguros preconizados pela Agência de Proteção Ambiental Norte-Americana (EPA). 
@ Original illustration_Mauricio Negro | Mercúrio Amazônia EIPI BE | ictiofauna contaminada por metilmercúrio
O estudo traz também uma série de recomendações, incluindo a interrupção imediata do garimpo em terras indígenas, um plano para descontinuar o uso de mercúrio no garimpo, assim como um plano de manejo de risco para as populações cronicamente expostas ao mercúrio. A coleta de dados ocorreu entre 29 de outubro e 9 de novembro de 2019, com 200 habitantes de três aldeias impactadas pelo garimpo: Sawré Muybu, Poxo Muybu e Sawré Aboy. O processo incluiu entrevistas, avaliação clínico-laboratorial, coleta de amostras de cabelo e coleta de amostras de peixes para aferição dos níveis de mercúrio.

"Quando tivemos a oportunidade de debater os resultados da pesquisa com as lideranças indígenas, percebemos o quanto seria importante falar com mais clareza sobre o impacto do garimpo e sobre como ocorre a contaminação humana e ambiental pelo mercúrio. Por meio do curso, buscamos empoderar essas lideranças incentivando o conhecimento técnico sobre o tema".

Ana Claudia Santiago de Vasconcellos, coordenadora geral da pesquisa

"Percebendo que a maioria das pessoas que são afetadas pela contaminação por mercúrio não entende com clareza como o mercúrio usado pelo garimpeiro entra em seu corpo e desconhece quais problemas de saúde o mercúrio pode causar, nós, pesquisadores da Fiocruz, tivemos a ideia de desenvolver um novo projeto de pesquisa e produzir recursos educacionais e de comunicação, como livros didáticos, livros literários, canções, filmes e cursos para envolver as comunidades indígenas nos debates sobre os problemas causados pelo garimpo de ouro na Amazônia. Nós acreditamos que o acesso ao conhecimento científico que é produzido pelas instituições de pesquisa é um direito de todo cidadão que vive neste país e pode ser uma importante ferramenta de luta em defesa do direito dos povos indígenas."

Ana Claudia Santiago de Vasconcellos, coordenadora geral
Paulo Cesar Basta, coordenador adjunto
autoria
Aldo Karo Munduruku
Ana Claudia Santiago de Vasconcellos Ana Paula Lucas Caetano
Claudeth Sau Munduruku
Daniel Munduruku
Deuziano Sau Munduruku
Gilmara Akay Munduruku
Honesio Dace Munduruku
Jairo Saw Munduruku
Luciane Saw Munduruku (Beka)
Maria Cristina Troncarelli
Maurício Yori Munduruku
Paulo Cesar Basta
Raiane Fontes de Oliveira
Rozeninho Saw Munduruku

coordenação geral | Ana Claudia Santiago de Vasconcellos

coordenação adjunta | Paulo Cesar Basta

realização | Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio – Fundação Oswaldo Cruz

financiamento | Edital INOVA PMA | Edital INOVA Saúde Indígena (inserir os números dos editais de fomento) | Associação Indígena Pariri | Projeto Xingu | Escola Paulista de Medicina | Unifesp

colaboração
Marta Gomes da Fonseca Ribeiro (EPSJV/Fiocruz)
Priscila Almeida Faria (EPSJV/Fiocruz)
Bárbara Campos Silva Valente (EPSJV/Fiocruz)

capa e ilustrações | Mauricio Negro

coordenação editorial | Camile Mendrot

edição | Denise Pasito Saú

consultoria técnica | Luany Molissani

projeto gráfico | Patricia Morezuela Oliveira

diagramação

pesquisa iconográfica
@ Original illustration_Mauricio Negro | Mercúrio Amazônia EIPI BE | Contaminação humana por mercúrio
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